quarta-feira, 29 de setembro de 2021

Senado aprova PEC que desobriga gasto mínimo em educação por 2 anos

 Tempo para planejamento é justificativa de prefeitos


Luiza Caire

Fonte: educacao.uol.com.br

Em: 21/09/21


O Senado aprovou hoje, em segundo turno, a PEC que desobriga os governos estaduais e municipais de aplicar os gastos mínimos em educação nos anos de 2020 e 2021 por causa da pandemia do coronavírus. Hoje, ao menos 25% da receita resultante de impostos devem ser destinados a esta área, segundo previsto na Constituição.

Agora, a Proposta de Emenda à Constituição 13/2021 segue para análise na Câmara dos Deputados e precisa de ao menos 305 votos favoráveis entre os 513 parlamentares. Apesar de ter passado no Senado, a PEC é criticada por especialistas e deputados da bancada da educação, que apontam uma preocupação com a "criação de precedentes”.

Para Lucas Hoogerbrugge, líder de relações governamentais do Todos pela Educação, a tendência é a "redução substancial da verba em educação". Segundo ele, antes da pandemia a maioria dos estados e municípios já cumpriam o investimento "quase na linha". Na prática, caso a PEC seja aprovada, os prefeitos e governadores não podem ser punidos caso não cumpram com os gastos mínimos para área. Eles devem, no entanto, compensar os recursos não investidos dos dois anos até 2023. Para o autor da proposta, o senador Marcos Rogério (DEM-RO), a crise econômica provocada pela pandemia do coronavírus é uma das justificativas para a existência da PEC, já que atingiu os cofres públicos. A queda na arrecadação e o aumento das despesas com ações relacionadas ao combate da covid-19 agravam a situação. Para o deputado federal professor Israel Batista (PV-DF), presidente da Frente Parlamentar Mista da Educação, a aprovação da PEC é "inaceitável". "Esse é o momento em que a educação mais precisa de suporte. Também nos preocupa o precedente que pode abrir para a diminuição de investimentos", explica Batista

O deputado federal Idilvan Alencar (PDT-CE) afirma que neste momento os governantes deveriam "reivindicar por mais recursos para recuperar o ano e meio sem aulas presenciais". Além disso, o político alega que educação "não é um gasto popular, não dá muito voto" e concorda que a PEC pode abrir margens para redução do investimento na área. O Anuário Brasileiro da Educação Básica 2020, divulgado pelo movimento Todos pela Educação em parceria com a editora Moderna, mostrou que os estados reduziram em 14% as despesas em educação no ano passado. Ao todo, foram R$ 11,4 bilhões a menos, se comparado com 2015. Em relação a 2019, a diminuição foi de 9%.


Senado Federal
Imagem: Agência Brasil


Não queremos criminalizar ou punir os gestores, pelo contrário, queremos que eles se sintam confiantes de trabalhar da forma mais técnica possível. Naquele momento [suspensão de aulas presenciais no início da pandemia], a saúde era essencial, tínhamos um problema de saúde pública. Mas o nosso medo é a educação continuar ainda em segundo plano. Lucas Hoogerbrugge, do movimento Todos pela Educação Para o deputado Idilvan Alenxar, 25% ainda é pouco perto do tamanho do desafio que a educação enfrenta. "Toda sala de aula é bem ventilada? Se não, o recurso sobrando pode ser utilizado para pequenas reformas. Não está sobrando dinheiro na educação, o que está faltando é disposição e prioridade”, avalia.


Sala de aula de uma escola pública
Imagem: Metrópoles

No ano passado, em números gerais, as despesas empenhadas (reservadas) ficaram em R$ 113,5 bilhões, e as pagas chegaram a R$ 103,2 bilhões. A falta de tempo "para investir com qualidade ainda neste ano" é uma das justificativas da FNP (Frente Nacional dos Prefeitos) para apoiar a PEC. "Tempo para planejamento é o principal objetivo da emenda. É necessário investir com qualidade o que requer planejamento", apontou o presidente da frente, Edvaldo Nogueira (PDT), prefeito de Aracaju.

Hoogerbrugge discorda que falta tempo para realizar os investimentos. "A pandemia começou em março, tivemos nove meses no ano passado para licitar, fazer aquisição. Também vimos a área da Saúde praticar os contratos de compras emergenciais. A prioridade deveria ser tão grande quanto", argumentou. A FNP garante, assim como os parlamentares que defendem a proposta, que a educação não perderá "nenhum centavo". Para a coordenadora geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Andressa Pellanda, a PEC representa mais um retrocesso ao financiamento da área. "Não precisaria ser uma emenda constitucional", disse.

Relatório divulgado pela OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) indicou que o Brasil foi um dos países que não aumentou o investimento em educação durante a pandemia. Portugal, por exemplo, chegou a contratar mais de 3.000 professores para aulas de reforço. A Nova Zelândia investiu US$ 62 milhões para dar acesso à internet aos alunos mais vulneráveis.

O impacto da pandemia na educação

 

Sem plano nacional para a educação, crise deve se agravar


Luiza Caire

Fonte: correiobraziliense.com.br

Em 03/06/21

 

As primeiras avaliações diagnósticas sobre o desempenho dos estudantes durante a pandemia começam a ser divulgadas — e são desastrosas, até para os mais otimistas. Os números são muito preocupantes não só quanto à aprendizagem, mas, também, no que se refere ao aumento da desigualdade e do abandono escolar; neste último caso, a situação é mais grave entre os jovens que estão no ensino médio.

Segundo estimativas da Organização dos Estados Ibero-americanos (OEI), divulgadas recentemente, a América Latina (AL) retrocedeu em pelo menos oito anos no acesso ao conhecimento durante a pandemia. Em razão do pouco incentivo governamental para o acesso ao ensino remoto, milhões de crianças e jovens ficaram literalmente sem estudar ao longo de 2020, e isso ainda continua neste início de 2021. A OEI estima que cerca de 17 milhões de estudantes dos últimos anos do ensino médio e dos primeiros anos da graduação terão dificuldades para continuar os estudos, principalmente por terem que auxiliar na renda familiar.

Crianças estudando com uso da máscara
Imagem: jornal.usp.br

O problema deve se agravar ainda mais, especialmente em países, como o Brasil, que não esboçaram nenhum plano nacional de conectividade digital que pudesse chegar aos mais pobres, levando-se em conta que a segunda onda de covid-19 está extremamente agressiva, e a vacinação, muito lenta. As escolas públicas devem continuar fechadas, em sua larga maioria. As escolas particulares, por sua vez, estão conseguindo oferecer o ensino combinado presencial e remoto, apesar das dificuldades geradas pelos ciclos sanitários da pandemia, que se agravavam em alguns momentos em determinadas regiões do país.

Quando a pandemia começou, em meados de março de 2020, e as escolas tiveram de fechar para o ensino presencial, as redes públicas de ensino que mais rapidamente se organizaram para oferecer o ensino remoto, guiado pelas novas tecnologias, foram São Paulo e Paraná. O estado de São Paulo combinou a oferta por meio de três grandes mecanismos: o chamado Centro de Mídias da Educação de São Paulo (CMSP), o uso de aplicativos para aulas on-line e as aulas assíncronas, numa parceria com a TV Cultura.

Ao longo do processo, a Secretaria de Educação começou a perceber que, apesar desses esforços, muitos estudantes não estavam conseguindo acessá-lo ou não conseguiam se adaptar a esse modelo de ensino. A preocupação com o abandono escolar começou a crescer, e, com isso, verificou-se a necessidade de se instituir um programa de busca ativa para trazer os alunos de volta às atividades escolares, mesmo que remotas.

E foi exatamente o estado de São Paulo que mais uma vez saiu na frente, divulgando agora os resultados provocados pela pandemia na aprendizagem escolar, ao avaliar, no início de 2021, estudantes do 5° e do 9° ano do ensino fundamental e do 3° ano do ensino médio em língua portuguesa e matemática. Os números mostraram que a pandemia provocou um grande estrago na aprendizagem escolar. O efeito maior se deu para os alunos do 5° ano. Em 2019 — portanto, antes da pandemia —, a nota média em língua portuguesa no Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) foi de 223 pontos, e, agora, esse número caiu para 194 — 29 pontos a menos —, o que equivale à nota média obtida há 10 anos, ou seja, em 2011. Em matemática a situação foi ainda pior. Em 2019, a nota média foi de 243 pontos, enquanto o resultado de 2021 foi de 196 pontos — ou seja, 47 pontos a menos —, o que equivale ao resultado de 14 anos atrás!

Em relação ao 3° ano do ensino médio, última etapa da educação básica, a rede retroagiu em 11 pontos e 18 pontos em língua portuguesa e matemática, respectivamente, voltando aos resultados próximos aos de 2013. Os resultados relativos ao 9º ano do Ensino Fundamental são muito similares a estes últimos. Se esta é a situação na rede estadual de São Paulo, imaginem agora o retrocesso escolar nos municípios mais pobres, nos grotões deste país, muitas vezes esquecidos pelo poder público. Precisamos reconhecer que há uma pandemia educacional que pode ser devastadora em médio e em longo prazo se nada for feito.

Os números de São Paulo revelam o dano cognitivo, mas há, também, o decorrente do tempo que os alunos ficam afastados das escolas, que impacta a saúde mental e o desenvolvimento socioemocional dos estudantes. É preciso que, urgentemente, o Ministério da Educação organize, em colaboração com as secretarias de Educação de estados e municípios, uma agenda nacional de enfrentamento à pandemia educacional, em colaboração com a sociedade. Como diz a poeta e educadora chilena Gabriela Mistral, ganhadora do Prêmio Nobel de Literatura: “O futuro das crianças é sempre hoje. Amanhã será tarde”.

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  Tempo para planejamento é justificativa de prefeitos Luiza Caire Fonte: educacao.uol.com.br Em: 21/09/21 O Senado aprovou hoje, em segundo...